3.07.2008

Os 18 centímetros do Júlio Isidro



Estimado(a)s leitor(a)s,

Hoje, dia 28 de Fevereiro, decidi, uma vez mais, entregar-me a vós, num silêncio ensurdecedor cada vez mais sufocante. Não resisto a este desabafo matinal à escala maior. Reconheço-me, também, pertencente ao direito de reclamar, decidir e exigir um mundo calibrado. Afinado através de uma única vóz.. A de todo(a)s nós. Até quando iremos nós assumir um Estado de Direito com um dia apenas para decidir os nossos próximos quatro anos no " purgatório "?! Somos democratas apenas em míseros referendos e/ou num único gesto nessa sentença irreversível?! Acabamos por "gramar" o nosso erro, sem direito a reconsiderar, durante longos anos, só porque alguns têm o direito à mentira crónica?! Pois, parece política.. E até é.

Mas desta vez, o que me tráz até cá é outro tipo de "fantasia" não menos viciada e com algum raccord na manga. A falar em "cronicidade", que é o tema em foco, começo pelos preliminares desta minha “doce facada”. Manifestando, desde já, o orgulho de ter pertencido à RTP, finais de noventa, depositando nela, a minha mais profunda solidariedade nesta sua nova etapa. Sei que está, e estará, à altura de exercer a essência dos objectivos a que se propõe, em representação de um serviço público nos campos da informação, da difusão cultural, do entretenimento e da ocupação dos tempos livres dos cidadãos. Este Governo, consciente desta realidade ( a ver vamos..) e tendo presente a evolução previsível para este sector, do audiovisual, na sequência das televisões à iniciativa privada, entenderá, certamente, como necessário desenvolver neste domínio uma política global e coordenada. Realço a minha mais alta estima e carinho perante esta que também se revelou ser a minha escola e “casa mãe” , RTP, e orgulhosa por exprimir, ainda hoje, laços invioláveis de amizade com uma comunidade de profissionais, excelentes profissionais, inserida nessa grande família. Assumindo a minha actividade única e exclusivamente concorrente (saudável), remeto-me ao afecto que nos une.

Dito isto, o apanágio da “facada” agora: Isto é, fui contactada perante um caso que já não me surpreende! Eu já sabia que, começando por consagrar o princípio deducente, a falta de critérios profissionais moldam algumas figuras consideradas insubstituíveis do nosso panorama televisivo. Aparecem sempre como meros convidados (auto-convidados) com o antibiótico da «TV Salazarista» debaixo do braço. Depois regressam porque "naqueles tempos é que era"(?) e "temos muito para aprender" seja qual for o grau da nossa formação. Voltam mais uma vez e a gente festeja, uma vez mais a bravura do seu historial.. Depois fazemos figas para que vá de férias ou somos obrigado(a)s a aceitá-lo no estúdio em nome do glorioso passado.. “naquele tempo é que era..” toca o disco outra vez.. Bem, sem darmos por nada ele já faz parte do cenário e até dar um ar de eterna revolução ao programa.. Vai-se tomar café.. Entretanto chegam pedidos supremos para que lhe sejam acordados alguns minutinhos de antena a mais.. Mais dez minutos.. “porque naquele tempo é que era..” sobe-se de regresso ao estúdio e?! O “antigo combatente” já é apresentador!!! “agora é que vai ser..“ os padrões do programa fazem o pino e toda a malta técnica é promovida a antiquária com a missão de puxar o lustro e tapar os buracos às velharias todas da época que desfilam em fila indiana durante o ano! O material (e pessoal) novo vai para a lista de espera e/ou é encaminhado para cursos de especialização até que alguém “ sem coração “ e “ com o tomateiro rijo “ caia do céu, com a patologia da limpeza, munido de lexívia e decapante na pasta. Entretanto falta retirar a cor à imagem, (re)pôr o apresentador com sotaque feirante, timbre de grafonola e mandar entrar a fanfarra dos cravos). Depois? Depois é só pedir ao Luís de Matos para nos dar uma mãozinha para que surja uma produção de nível europeu com os trocos que sobram dos cachets (ex)coloniais.
Não nego a minha total admiração perante alguns casos de mestria madura nesta profissão, não obstante, há que saber triar o(a)s que procuram refúgio em medalhas de bijutaria política. Ontem, a RTP festejou o aniversário de uma programação diária principalmente destinada à comunidade portuguesa sediada além fronteiras. Nessa euforia, o “senhor televisão” Júlio Isidro, responsável por uma pequena rubrica semanal, deu uma cambalhota daquelas que só um(a) péssim(a)o e submiss(a)o profissional é capaz de perdoar. A “senilidade impõe certos limites” meus caros colegas. Há erros inadmissíveis com os quais me recuso pactuar! Após a exibição de uma breve retrospectiva (compacto) de imagens alusivas à referida rubrica, destinada a entrevistar diversas figuras públicas durante estes últimos meses(em que o único interveniente estrangeiro conseguido ao longo dessa série foi, nem mais nem menos do que o Charles Aznavour, por ocasião da sua passagem por Portugal, há dias), o dito apresentador “profissional de alto calibre nacional", sorridente e orgulhoso por sobreviver também à custa dos contribuintes que o vomitam pelos olhos, não encontrou nada de mais “profissional” ou “chic” do que proferir uma simples frase no seu comentário em directo: "ele (Aznavour) já têm uma certa idade, eu sou mais novo, aliás, ele têm 1.64 m (ele até foi vasculhar a altura do cantor) e eu 1.82". Fim do curto e caricato comentário.
Agora, só nos faltava a costumeira intervenção do nosso Primeiro, em sua defesa, com a não menos costumeira frase nasalada “ não, senhores jornalistas, entenderam mal! os portugueses sabem que o que ele quis dizer não era isso..” Esta aberrante gaff, a que tive acesso esta manhã, está e estará arquivada na RTP para mais tarde recordar, sem qualquer dúvida. Quanto(a)s profissionais da RTP não deitaram mãos à cabeça no estúdio, após este (mais um) magnífico exemplo de profissionalismo por parte desta “ilustre vedeta” ?? Simples director(a)s ou chefes ou assistentes ou secretárias de produção, operador(a)s de imagem, de steadicam, editor(a)s, montador(a)s, assistentes, cenógraf(a)os, aderecistas, grupistas, maquinistas, runner, realizador(a)s ou primeir(a) assistente de realização, script, etc etc.. e etc.. da RTP??? Fui contactada de imediato. Quem não ouviu dizer que só as más notícias correm as capelinhas à velocidade da luz?! Uma equipa técnica (credenciada, jovem e atida à qualidade) terá culpa de não haver bom senso na cabecinha de quem persiste em colocar no ar, entregues às malhas do directo, tais apresentadores destinados à “fama da naftalina” apenas por solidariedade ao seu passado? A malta nova acaba por não se retratar em produtos medievais a acaba por procurar respirar sob horizontes ditados por uma lógica isenta de inércias do caruncho. Temos profissionais excelentes, em Portugal, obrigado(a)s a colaborar em produções electrocutadas à nascença só porque uma peça oxidada não pode, ou não quer, aceitar as regras de um jogo luzidio. Depois, quando alguém, dotado de algum bom senso, recusa alinhar num audiovisual previamente fracturado, representa uma ameaça quando bate com a porta e entra pela do vizinho?! Quem não tem a liberdade de ser exigente, em consequência, não viabiliza o prestígio projectado, com ou sem o apoio do Estado meramente supletivo. Os mecanismos utilizados nesses moldes, visando contemplar aquelas produções ou co-produções de importante dimensão financeira, ou não, em relação à media nacional, que conciliam o interesse cultural com a viabilidade comercial, acabam sempre por ceifar os responsáveis com uma pomposa taquicardia orçamental, deixando tudo e todos aos berros em todas as reuniões atreladas ao “ acidente de percurso ". Será preciso grandes discursos arrítmicos para se conseguir uma pulsação saudável após cada apreciação administrativa no âmbito destas farsas? As regras do directo são para cumprir à risca. Até por quem se dá ao luxo não aprender nada. O verdadeiro profissionalismo básico resume-se em saber substituir impulsos textuais imbecis pelo silêncio inteligente. O entusiasmo desgovernado nunca foi cumplice de resultados satisfatórios em televisão (2007). São umas das primeiras regras implementadas aos novatos interessados nas lutas pela qualidade. Reparem na elegância do fabuloso disparate: A dita rubrica tem como cenário habitual o Lapa Palace, hotel na Lapa, mas, para a ocasião, no caso do cantor (e actor) internacional, atendendo à escassa disponibilidade do artista, as gravações cortesmente concedidas a favor da RTP, em cima do joelho, tiveram lugar num espaço improvisado a pedido da produção. Um gesto que valeu àquela Estação esta linda medalha oxidada.

Cantor, autor e compositor de renome, Charles Aznavour é uma figura serena, mas que ergueu um património marcante no seio da canção francófona. Em finais de 80, a sua notoriedade agitou a França, ao liderar um projecto constituído pelas principais figuras do mundo da música e do cinema em prol de um movimento a favor da Armenia “ pour toi Arménie ". Na década de noventa o cantor vestiu o papel de actor numa co-produção também rodada em Portugal. Admirado por gente de todas as idades e de todos os meios, o público francês, e não só, não hesita em colocá-lo no grupo dos dez maiores da canção francesa : Johnny Halliday, Sacha Distel, Jacques Brel, Gilbert Bécaud, Georges Brassens, Yves Montant, Léo Ferré, Charles Trenet e Maurice Chevalier. Tanto quanto o nosso - humilde - apresentador, tive o privilégio de assistir ao espectáculo da passada semana. Umas (merecidas) palavrinhas simpáticas sobre aquela noitada não roubariam nenhum milímetro ao nosso apresentador.

Tenho 29 anos, danada por musicalidades mais «radicais» certamente, mas voltei a sentir-me reduzida a quase nada quando, do alto do meu 1.79 m, me verguei pela terceira vez da minha vida para cumprimentar e abraçar carinhosamente o grande artista. Quanto ao nosso rotulado "senhor televisão" e/ou "caçador de talentos" (como queiram), adivinhando que por força das nossas vidas e/ou pela mão das nossas “providências circundantes da ribalta” mais próximas, esta minha intervenção ser-lhe-à servida numa bandeja forjada à medida da sua tão divinal estatura e porque é amante de aeromodelismo, aproveito para lhe deixar no "ar" um pequeno fragmento extraído de um célebre tema, badalado pelo Aznavour (já agora), seguramente em voga nos tempos da sua mocidade lisboeta. E porque recordar é viver, aqui vai Sr. Isidro (juro que esta pequena citação volátil foi mesmo ao acaso):

“Rien que sous mes pieds de sentir la scène, de voir devant moi le public assis, j´ai le coeur battant. On m´a pas aidé, je n´ai pas eu d´veine, mais au fond de moi je suis sur d´avoir du talent”


...e assim cantou uma outra vóz, mas com outro tipo de maturidade.




Laetitea