É certo que a convergência entre TV e Internet e a aplicação de linguagens digitais à emissão tradicional implicam toda uma nova forma de ver as coisas. Obedecendo à extração conclusiva dos diversos tópicos debatidos num colóquio, na passada semana em Paris, o protagonismo do aparelho receptor pode levá-lo a converter-se no centro de todas as comunicações do lar. Nele, segundo alguns cálculos, coincidirão os interesses, as projeções e os cataclismos de nada menos do que cinco indústrias: o negócio televisivo em si, as telecomunicações, a informática, a electrónica de consumo e finalmente a Internet. De facto, o aparelho que antes apenas servia para receber sons e imagens agora é a peça central de todo o tipo de estudos e, consequentemente, de operações, desde a educação interactiva até ao controlo das emoções, passando, incontornavelmente, pela cibernavegação ou videoconferência. O método é simples. Imaginemos um cenário possível. O leitor (do blogue) está a ver o seu programa desportivo favorito (futebol, acertei?) e sente uma tentação súbita e incontrolável (...) de comprar uma camisola igual à do nosso craque madeirense. Bastar-lhe-à mover o telecomando, fazendo coincidir a seta com o Cristiano e carregar num determinado botão. Com um gesto ligeiramente diferente, poderá então ler uma biografia do jogador, navegar pela Internet em busca de outros fãs e/ou pedir ao terminal que o ligue por videofone a um amigo, a quem poderá, perguntar a opinião sobre a última grande penalidade marcada pelo árbitro, por exemplo.
Todo isto e não só faz parte do novo conceito de "portal TV", no qual estão atualmente empenhadas dezenas de empresas. Trata-se obviamente de sistemas de televisão interativa em banda larga. Afastada dos habituais ratos e feixes de infravermelhos, a aposta passa por uma interface que seja imediatamente compreensível pelo espectador comum, com recurso a um menu intuitivo apresentado no próprio ecrã (tela ou monitor, como queira). Porém, por muito prometedor que pareça o futuro (neste sentido), a prosaica realidade encalha noutros detalhes e lembra que as coisas não são assim tão simples. No entanto, há outros fenómenos relacionados com o meio televisivo que, sem assento direto nas tecnologias, propiciam a mudança. A forma de fazer televisão e, sobretudo, a forma de vê-la, tornaram-se obsoletas. Do ponto de vista do utilizador (termo importado do mundo da informática, e que tenderá a substituir os de "espectador" ou "telespectador"), a transmissão será completa, havendo inclusivamente alguns analistas que chegam a falar de uma nova espécie, chamamos-lhe Homo teledudens, capaz de tirar todo o partido da "caixinha mágica". Um conceito que encontra eco na intenção de alguns dos novos ideólogos deste meio.
Dito isto, passando ao cerne desta publicação, vamos então aos conteúdos para 2013:
O elevado conteúdo lúdico da nova televisão é precisamente um dos fenómenos mais notórios da transformação em curso. A Televisão já não é (já não é para alguns e deixará de ser para a maioria dentro de algum tempo) principalmente um meio de comunicação, uma plataforma de informação ou um mecanismo de controlo. É, essencialmente, uma caixa de animação. Efetivamente, de olhos postos na atual situação dos portugueses e não só, uma profunda reflexão impõe-se. Mediante a atual atmosfera depressiva, só um estudo exaustivo sobre o novo perfil do espetador pode fornecer os elementos cruciais. Sustentada e ordenada pelo "emisféro do zapping", a multiplicidade da oferta coloca uma enorme quantidade e variedade de produtos e serviços televisivos. Os (recentes) hábitos de comportamento do espectador impõem, a qualquer estação televisiva prevenida, uma programação adaptada ao novo modelo de vida. Ou melhor, quais os conteúdos procurados pela maioria agora subvertida por esta nova condição?!. Para qualquer especialista nestas lides é sabido que a espetacularidade vicia, pelo que esta requer um manuseio cauteloso. Tal como as drogas, o (tele)espectador poderá alcançar limiares de tolerância e, consequentemente, perder a capacidade de se impressionar. Todavia, devido aos atuais percusores de realidade aumentada, algumas classificações, como o sensacionalismo, não beneficiam, nesta altura, nem as televisões nem as famílias, respetivamente. Se falarmos em depreciações, gastos de financiamento e impostos, totalizamos uma série de preceitos constrangedores. Suplantar tragédias - reais - elevadas, donde se solicita moderação, com recurso a conteúdos assentes em dramas ainda maiores não ajuda ninguém e pode acarretar efeitos sociais desastrosos. A solução passa pelo apelo à tolerância, ânimo e esperança. Mais do que nunca, os portugueses precisam de uma terapêutica intensiva à base de agentes positivos.
No futuro próximo, é mais do que provável que surjam novas apostas sustentadas pelo Humor e que outras já existentes venham a beneficiar de um tónico humorístico adicional/exclusivo. A taxa acrescida deverá rondar veementemente os 20 pontos porcentuais em 2013 e 2014. Os formatos que impliquem beneficiências deixam antever um outro iníquo aumento. Enquanto isso, importa realçar que estamos a atravessar uma época despojada de mecanismos de incentivo ao investimento nesta área, nomeadamente sem um complemento liberatório a obter nesta industria, toda a intenção declarada de dinamizar o mercado do audiovisual seria um autêntico golpe - primário - ao plafond considerado de último recurso. Sejam quais forem as previsões - bolsistas - (des)favoráveis entretanto denotadas, esta quarentena estender-se-à, em Portugal, num prazo nunca inferior a três anos, isto é, no melhor dos cenários, até 2015.
Tal como foi já realçado na minha publicação «Televisão à la carte», datada de 13 de novembro de 2009, ainda não se falava na Troika, o investimento - dito inteligente - adotava já uma configuração acautelada francamente abaixo do desejado. Embora os orçamentos em causa estivessem já totalmente provisionados e os acordos anteriores não excedessem o valor da provisão, hoje há reflexos claros nas contas de exploração - variações negativas nos proveitos e variações negativas nos custos de produção. Significa isto que para o setor houve uma diminuição de valor tangível no decurso dos últimos anos. Acresce que, comemorar condignamente a Televisão em Portugal, honrando o seu passado, é assegurar a sua sustentabilidade económica e financeira, que é a garantia do seu futuro. As televisões precisam de recuperar tanto a diversidade como a amplitude do mercado.
E porque se trata de uma altura profundamente sensível onde a esperança, a solidariedade e a união representam, para Portugal, o único folgo vitalizante, compete às Televisões regenerar as correntes de (re)oxigenação positiva. Portugal sofreu um sinistro transversal e o segmento televisivo necessita de uma assistência saudável.
As Televisões precisam regozijar-se de espectadores, não de pacientes!
Laetitea